sexta-feira, 30 de novembro de 2012

O primeiro ano na direção do CPEI (2012)


O Centro de Pesquisa em Etnologia Indígena foi criado em 1995, por iniciativa de quatro professores do Departamento de Antropologia - Robin Michael Wright, Vanessa Lea, Marcio Ferreira da Silva e John Manuel Monteiro - com o apoio de docentes do IEL - Instituto de Artes e do Instituto de Estudos da Linguagem. Seus principais objetivos eram proporcionar um local de referência para pesquisadores de diversos institutos e departamentos da UNICAMP que trabalhassem com temas ligados aos estudos indígenas, assim como diminuir a falta de articulação entre os diferentes níveis de pesquisa e ensino referentes à área de etnologia no próprio IFCH. Como o seu documento de fundação fazia referência, a criação do Centro ocorreu em um momento de amadurecimento do debate etnológico e indigenista no país, movimentado por um número crescente de centros de pesquisa e organizações não governamentais, aos quais a produção intelectual dos seus membros fundadores estava articulada. O CPEI tinha, assim, o objetivo também de incorporar plenamente esta produção, ao fornecer um canal institucional específico para o intercâmbio de pesquisadores, de publicações e de informações. Respondendo a estes objetivos, o seu plano de trabalho incluía dois tipos de iniciativas. De um lado, criação de uma agenda de eventos, composta por um Seminário Permanente de pesquisa e outras iniciativas pontuais, como cursos de extensão, mostras de vídeo e encontros de pesquisadores. De outro lado, a criação de duas linhas de publicações: um boletim informativo semestral - com notícias sobre pesquisas e eventos, e uma seção bibliográfica – e uma linha de publicações avulsas, com vistas a divulgar primeiras versões da produção dos membros do Centro e dos pesquisadores convidados para os seus seminários.

Este é o Relatório do CPEI para o ano de 2012 – também meu primeiro ano como professor do Departamento de Antropologia da UNICAMP e como coordenador do CPEI, por convite e em sucessão da profa. Vanessa Léa. Recuperar os termos sob os quais Centro foi criado há 17 anos é, por isso, uma forma interessante de introduzir as iniciativas que realizamos ao longo deste ano, assim como as nossas propostas para o próximo. Sem pretender qualquer análise extensa, é importante começar destacando alguns elementos que diferenciam o contexto atual do contexto de criação do CPEI.

Primeiro, no plano interno à UNICAMP houve, nos últimos anos, uma drástica redução do número de professores de todos os departamentos do IFCH e, em consequência, uma redução tanto nos quadros da etnologia indígena do Departamento de Antropologia quanto dos pesquisadores de outros departamentos interessados no tema.

No plano nacional, aquele contexto de ‘amadurecimento do debate etnológico’ e de florescimento de centros de pesquisa e de defesa da causa indígena foi substituído por um contexto sombrio de largo e franco ataque aos direitos indígenas, seja por parte da mídia, seja por força de uma Bancada Ruralista presente nos parlamentos Federal e estaduais ou, finalmente, em consequência das iniciativas do próprio Poder Executivo. Há uma retomada do desenvolvimentismo econômico que, assumindo a bandeira do ‘combate à miséria’, revive a pauta dos governos autoritários da década de 1970, fazendo tabula rasa das conquistas sociais e ambientais impulsionadas pelo entusiasmo cívico da redemocratização dos anos de 1980 e 90.

Outros três elementos são importantes para completar este quadro.

Das conquistas sociais dos anos 80-90 emergiram lutas de novas frações da população do campo no Brasil pelo reconhecimento de seus direitos que, de certa forma, se aproximam da questão indígena: ou por reivindicarem um modo de vida tradicional, ou por reivindicarem, além da tradicionalidade, um caráter étnico.

Além disso, tais lutas ganham tradução teórica e legal nas políticas de reconhecimento das diferenças, florescentes nos planos internacional e nacionais. Delas resultam diversas reavaliações das categorias classificatórias disponíveis – parte delas herança direta das relações coloniais – que alteram a linguagem dos movimentos sociais, dos Estados e o próprio repertório analítico das Ciências Sociais. Reflexo disso são os estudos teóricos e etnográficos, assim como os encontros acadêmicos que questionam a rigorosa separação que, na tradição do pensamento social brasileiro se constituiu entre os estudos sobre negros e os estudos sobre índios.

Finalmente, da expansão econômica do país nos anos 2000 e, da decorrente expansão dos quadros universitários federais e dos recursos destinados à pesquisa acadêmica, resultou também uma abertura do ‘campo’ etnográfico explorado pela Antropologia brasileira: multiplicam-se as pesquisas além fronteira, tanto em países fronteiriços quanto no Caribe e em África, atingindo também, em menor número, a Ásia e a Oceania.

Assim, de um lado temos a complexificação do campo étnico no Brasil, com o surgimento dos quilombos e das populações tradicionais demandando o interesse da etnologia e, de outro, temos uma expansão dos estudos etnológicos nacionais sobre outros territórios culturais.



Ao assumir coordenação, em abril passado, encontrei o CPEI animado por uma equipe muito ativa de estudantes da Pós-Graduação em Antropologia, que vinha organizando o chamado ‘Seminário Permanente’ – transformado, nos últimos anos, na atividade por excelência do Centro. Além do Seminário Permanente, estes mesmos estudantes também organizavam debates em torno dos seus próprios projetos de pesquisa, como uma forma de socializar temas, dificuldades e orientações.

A ideia que nos orientou neste primeiro ano foi, basicamente, garantir a continuidade destas iniciativas e a participação dos alunos, para em seguida, na medida do possível, ampliá-las na direção em que a mudança de contexto, evocada acima, parece exigir.

Para isso propusemos projetos de pesquisa e de eventos acadêmicos, iniciamos diálogos e parcerias com outros Centros de pesquisa e, finalmente, estimulamos os estudantes a se organizarem em grupos de trabalho mais bem definidos em torno de temas que aproveitassem a convergência entre seus interesses. Abaixo segue um sumário dessas iniciativas.

No campo dos projetos destinados à realização de eventos: Apresentamos, em parceria com o CERES (também da UNICAMP), projeto para a realização de um workshop nacional sobre o tema das classificações étnicas e suas sobreposições territoriais com áreas de preservação ambiental; Iniciamos diálogos com o AFUNDA (da UFSC) em torno de um seminário latinoamericano sobre a relação entre Antropologia e Estado, tendo em vista as novas políticas dirigidas às populações indígenas e afroamericanas tradicionais.

No campo dos projetos de pesquisa: Tivemos dois projetos aprovados, ligados ao grupo indígena Pankararu. De um lado abordando a sua produção artística e artesanal e, de outro, abordando o seu processo migratório entre o sertão de Pernambuco e a capital paulista, como porta de entrada para o tema dos índios nas cidades; E, finalmente, um projeto, em parceria com o NEPO (da UNICAMP) destinado a investigar etnograficamente as recentes mudanças introduzidas nos Censos Populacionais de países da América Latina que tem em vista visibilizar as suas diversidades internas, étnico-raciais, de cor ou nacionais.

No campo dos diálogos acadêmicos: Além das parcerias com o CERES e o NEPO, ambos da UNICAMP, e da aproximação com o AFUNDA, da UFSC, há também uma iniciativa de diálogo com a ‘DesiguALdades’ - Rede de Pesquisadores sediada na Universidade de Berlin, em torno do tema das Políticas de Reconhecimento e seus efeitos sobre os grupos étnicos no Brasil e demais países da América Latina.

Finalmente, no campo da organização interna do próprio CPEI: Estruturamos o trabalho de um Grupos de Pesquisa, em especial, dirigido especificamente para a análise do comportamento da imprensa diante da questão indígena; Apresentamos dois projetos a um edital interno à UNICAMP solicitando bolsistas para o apoio às nossas atividades; Iniciamos a reformulação do nosso site, de forma a torná-lo mais dinâmico e funcional; E, finalmente, iniciamos atividades aparentemente mais prosaicas, mas fundamentais à nossa melhor articulação, como a organização do nosso espaço físico e a aquisição de equipamentos como computadores e impressora.


Mas resta ainda muito a fazer. Além de dar conta das atividades de pesquisa e dos eventos científicos para os quais já garantimos recursos, temos como metas para 2013: Ampliar nossa incidência sobre o corpo discente da graduação, de forma a criar um novo fluxo de estudantes interessados na agenda do CPEI; Criar condições institucionais mais adequadas ao crescimento do Centro no interior da estrutura universitária; E, finalmente, articular teórica e academicamente a diversidade das nossas perspectivas de pesquisa, de forma a enfrentar os desafios colocados pela ampliação do campo da etnologia e pelas novas configurações das questões e dos estudos com povos indígenas.

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