O contexto de greve discente em que estivemos envolvidos, mesmo depois de dissipado, nos
apresenta questões que exigem atenção e debate.
Esta greve tem seu estopim em um evento de máxima violência
vivido no Campus, a morte de um estudante no contexto de uma festa considerada
ilegal, mas tolerada pela Reitoria, do qual resultou o anúncio, mais tarde
negado, de que esta mesma Reitoria autorizaria a presença da Polícia Militar no
Campus. Reagindo a este anúncio, a greve dos estudantes da UNICAMP se
apresenta, em parte, como desdobramento de uma mobilização nacional que, tendo
origem nas jornadas de junho, foi prolongada até poucos dias pela luta dos
professores de ensino publico do Rio de Janeiro e pelas amplas e intensas
manifestações contra os leilões de campos do pré-sal promovidos pelo governo
federal. Eventos de ponta a ponta marcado pela atuação violenta e arbitrária da
polícia, e até mesmo do exército e da Força Nacional, sob beneplácito dos
governos municipais, estaduais e federal.
Coincidentemente ou não, em meio à greve, chegou-nos ao conhecimento a decisão da Prefeitura do Campus – tomada, aliás, sem nos dirigir qualquer consulta prévia – de demolir a lanchonete do IFCH, importante espaço de sociabilidade de alunos, professores e visitantes, único remanescente da demolição ou desativação de espaços semelhantes no em torno do nosso instituto. É inegável o efeito preocupante que o encadeamento desses eventos, de escalas e qualidades tão distintas, mas todos dotados de significativa carga de violência, produz sobre todos nós.
Coincidentemente ou não, em meio à greve, chegou-nos ao conhecimento a decisão da Prefeitura do Campus – tomada, aliás, sem nos dirigir qualquer consulta prévia – de demolir a lanchonete do IFCH, importante espaço de sociabilidade de alunos, professores e visitantes, único remanescente da demolição ou desativação de espaços semelhantes no em torno do nosso instituto. É inegável o efeito preocupante que o encadeamento desses eventos, de escalas e qualidades tão distintas, mas todos dotados de significativa carga de violência, produz sobre todos nós.
De outro lado, a temporalidade da greve em nossa
universidade encontra evidente correspondência com a greve dos estudantes de
outra universidade estadual paulista, a USP, em cujas reivindicações por
democratização da estrutura e dos mecanismos de tomada de decisão
universitários nossos grevistas buscam se espelhar, reproduzindo os mesmos métodos, como os cadeiraços, apitaços e tais. Métodos que recentemente foram
questionados por uma carta aberta assinada por uma fração significativa de
professores da FFLCH, por substituírem o convencimento por ações coercitivas. Essa
carta coletiva, assim como as imediatas reações a ela, individuais, mas
igualmente públicas, circularam entre nós, provocando discussões pontuais,
assim como evidenciando que nossa posição de silêncio e expectativa havia
chegado a um limite delicado.
Em uma tênue tentativa de resposta a isso, foi convocada,
por meio da lista geral de professores do IFCH da UNICAMP, uma reunião com o objetivo de iniciar a
discussão sobre uma tomada de posição. Apesar de nosso instituto contar com
pouco mais de cem professore plenos permanentes, apenas três puderam ou
quiseram participar desta conversa. Quorum em si mesmo significativo do tipo de
problema vivido por nossa comunidade acadêmica e parte do desafio a ser
superado. Ainda assim, foi possível testar algumas idéias.
Em primeiro lugar, está claro que o debate, realizado predominantemente por meio de textos circulados na internet, sem nem mesmo o dialogo face-a-face, corre o risco de nos levar a uma espiral meta-discursiva onde predominam a retórica, as acusações ideológicas e os posicionamentos reativos, incapazes de produzir qualquer outro efeito além da simplificação e do acirramento das posições.
Em primeiro lugar, está claro que o debate, realizado predominantemente por meio de textos circulados na internet, sem nem mesmo o dialogo face-a-face, corre o risco de nos levar a uma espiral meta-discursiva onde predominam a retórica, as acusações ideológicas e os posicionamentos reativos, incapazes de produzir qualquer outro efeito além da simplificação e do acirramento das posições.
No lugar disso, e para além das críticas que possamos
formular aos posicionamentos do movimento estudantil que optou pela greve e
pelas barricadas, nos parece fundamental sair da posição reativa, para assumir
a responsabilidade que nos cabe diante dos diagnósticos a que chegamos.
O mais elementar desses diagnósticos passa pela
identificação de um esvaziamento e de um abandono (por displicência ou forçado)
do nosso espaço comum. Espaços de sociabilidade ameaçados sem que saibamos por
que razão, prédios fundamentais ao crescimento de nossas atividades acadêmicas
eternamente inacabados, espaços de circulação pouco iluminados, um anfiteatro
degradado e de uso precarizado, assembleias estudantis e reuniões de professores
esvaziadas, limites disciplinares transformados em muros aparentemente
intransponíveis, um ensimesmamento da universidade que dá as costas aos
problemas e expectativas da comunidade do seu entorno. Tudo isso aponta para a
necessidade de voltarmos a investir no cuidado e no cultivo do espaço e da vida
em comum. Nenhum projeto político ou acadêmico pode abrir mão desta condição
básica que, porém, nos está escapando.
Em função disso é necessário propor ações imediatas que
tenham em vista dar conta do nosso espaço comum, recuperar uma noção solidária,
crítica e vigorosa de comunidade acadêmica, eliminar a ideia, tornada quase um ethos da militância estudantil – e ao qual nós não podemos negar algum
fundamento – de que há uma oposição entre o mundo dos estudantes e o mundo dos
professores. Uma dicotomia francamente e erroneamente análoga à que define a
relação entre o operário do chão de fábrica e o capataz ou diretor de fábrica. Tais
ações imediatas não devem substituir o debate político sobre os temas postos em
pauta pelo movimento estudantil e por nós mesmos em nossos diferentes
engajamentos, mas devem criar ou reconstituir as condições do ambiente no qual
tais debates possam ocorrer.
Uma greve não pode ser apresentada como uma oportunidade de discutir temas políticos na Universidade, porque isto é
basicamente o mais importante que a Universidade deve fazer enquanto está em
funcionamento, e não quando está parada. Por isso é preciso não retornar às aulas como se nada tivesse acontecido. É preciso sair da posição reativa e passar à pauta das ações que estão ao nosso alcance.
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